Falávamos sobre verdade. Arnaldo disse que a verdade não existe, o que existem são verdades. Esse é um posicionamento relativista que muito me agrada, mas que me parece bastante incompleto. Seu argumento foi mais ou menos o seguinte: se um homem se suicida se jogando da janela de um prédio, cada pessoa que observa o fato, por ser atravessada pelo simbólico, faz uma leitura do que viu. Logo, o fato se transforma em fatos, pois existem várias versões, várias visões do mesmo. Certo? Sim. Mas existirem várias interpretações de um fato não muda que alguma coisa aconteceu de algum jeito específico. O pulo do gato, é que não dá pra enxergar esse jeito.
Arnaldo também disse que, observando a narrativa bíblica de gênesis, repleta de metáforas, quando Adão e Eva comem o fruto da árvore da vida, eles estão comendo o fruto que permite o conhecer. Interpreto a mordida do fruto pelas personagens como o momento em que somos inseridos na estrutura linguística, estrutura que nos faz ler o mundo, da qual é impossível fugir. Portanto, estrutura pelas quais construímos nossas "verdades". Para conhecer, damos nome. Tudo o que existe, existe porque nomeamos. Igual aquela história de que alguns grupos de esquimós tem muitos nomes para a cor azul porque existe a necessidade cotidiana do grupo de diferenciar tonalidades que para a minha cultura não existe.
Mas, será que, hipoteticamente, de acordo com as possibilidades interpretativas bíblicas, antes de conhecer qualquer coisa, lá no jardim do Éden, os seres humanos não estavam imersos em uma estrutura que ultrapassava à linguística? Estrutura essa que permitia que enxergassem a totalidade das coisas? A "verdade"? Enxergassem, mas a ponto de poderem ter acesso à totalidade como Deus tinha (não podiam tocar a árvore do conhecimento mesmo que fizesse parte do paraíso), por serem co-criadores? Enfim, o paradoxo da comunhão.
Escolhendo o conhecimento, Adão e Eva escolheram também a limitação pela estrutura da linguagem, do conhecer, perdendo o acesso à todos os componentes do paraíso. A existência atravessada pela linguagem é uma existência filtrada, pois precisa da estrutura. Por isso a expulsão do paraíso, não por termos uma personagem de Deus previsível e autoritária, "plana", como apontado por Arnaldo. Para que fosse possível seguir existindo vida em um mundo palpável de habitar a partir da estrutura da linguagem, já que o antigo já não era mais acessível. Outros pontos que o professor desenvolveu, como a questão da desobediência e valoração negativa do trabalho e das dores do parto são outra história (que ainda não pensei sobre e não tenho nada pra contribuir como cristã), mas quem sabe qualquer hora não tenha.
Tá aí porque acho o argumento relativista das verdades incompleto. Existem diversas verdades, já que confirmamos nosso atravessamento estrutural pelo simbólico. Mas como saber se "A verdade" existe ou não? Impossível, pois ultrapassa a compreensão do nosso sistema de leitura do mundo. Permanece então, a fé. Ou a falta dela. Por que, no final, se existe ou não "A verdade", não importa pra ciência, porque não temos muito como acessá-la metodologicamente. Porque continuamos reféns da estrutura, e o real continua a escapar.
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