quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

A viagem de Chihiro: Haku, o namorado dragão

Haku e Chihiro é, com certeza, a representação mais pura que eu já vi de um relacionamento amoroso em uma animação (tinha que ser do Studio Ghibli mesmo né?). É um relacionamento sutil, que é criado aos poucos, muito naturalmente, é incrivelmente profundo e sensível. Algo que deixa toda a construção de ambos muito bem feita é o fato de o relacionamento amoroso não ser o foco central da história, mas sim uma consequência. O nome da animação "A Viagem de Chihiro" deixa claro que a história que vamos acompanhar diz respeito a jornada de uma menina, do crescimento dela, que é só dela. Mas o crescimento dessa menina, como de qualquer outro ser humano, perpassa por relações. Haku é um companheiro de jornada de Chihiro, que dá a ela, em sua imperfeição, uma amizade genuína e protetora, e em nenhum momento tira dela o que é seu por direito: seu espaço de crescer por si mesma. 
O relacionamento dos dois gira em torno do conceito de identidade, muito abordado no filme. Haku é o aprendiz de feiticeiro de Yubaba, e, assim como os outros trabalhadores da casa de banhos, ele já não se lembra do seu nome. Entretanto, o caso de Haku é diferente: não foi a feiticeira que lhe roubou o nome, mas ele quem o perdeu (como?? gostaria muito de perguntar isso pra ele!). Haku aparece no mundo espiritual assim como Chihiro, "de repente". Ele deseja se tornar um grande feiticeiro e pede para que Kamashi o ajude, mas o velho recusa o pedido: Haku quer apenas suprir de maneira rápida e prazerosa o vazio da sua falta de identidade, não aprender sobre magia. Sem saber como procurá-la, aceita a proposta de migalhas vinda de Yubaba, e acaba sendo manipulado "por uma maldição" que o transforma em um ladrão. 
Desde o primeiro encontro de Haku e Chihiro, ele se esforça para que a menina se agarre a sua identidade: "Se você esquecer quem é, ficará presa nesse mundo para sempre" - só faltou adicionar "como eu", rs. Há uma cena em que ele entrega para Chihiro a roupa que ela usava quando se conheceram, e ela encontra o cartão de despedida com seu nome que seus colegas da cidade antiga lhe presentearam. No mundo dos espíritos, ela se chamava "Sen" e ao se lembrar quem era, ela chora. Ele também leva a Chihiro para ver os pais no chiqueiro, o que é muito doloroso, mas necessário para lembrá-la do que a motiva crescer: ela tem um objetivo, não pode perdê-lo de vista. Haku alimenta Chihiro com um "bolinho encantado" quando ela está desistindo de se alimentar pela tristeza, o que a deixa forte.  
Haku é essa ambiguidade de sentimentos: mais humano, impossível. Chihiro conhece todas as partes (ambas de maneiras muito intensas, diga-se de passagem) e luta por ele como ele luta por ela. Chihiro não se importa com as partes ruins, porque enxerga as circunstâncias. Chihiro vê bondade em Haku e se nega a deixar Haku se afundar nas próprias escolhas tóxicas dele. Como alguém pode se ver de um jeito tão ruim como Haku se via sendo tão bom como era pra Chihiro? 
Eu AMO a cena que ela literalmente "esmaga" o feitiço de controle (que representa a maldade do Haku) com os pés. 
Chihiro não mede esforços para reparar o erro de Haku, para salvá-lo da morte. Quando ele acorda, fica claro que ele estava sendo profundamente manipulado pela ideia que tinha de si mesmo através da ação da Yubaba, porque ele não se lembra de ter roubado algo importante. Tudo o que ele se lembra é da dor. E de seguir a voz da Chihiro. 
Chihiro faz uma longa viagem de trem até a casa da Zeniba, a feiticeira gêmea da Yubaba, dona do objeto roubado. Ali, Chihiro demonstra um amor muito genuíno por Haku se desculpando por ele, porque deixa seus pais correndo risco de serem "jantados" pelos espíritos (já que são porcos) na sua ausência. Uma cena que eu acho muito simbólica é a cena do trem andando sobre as águas. Me lembra os impossíveis de Jesus. Haku estava morrendo pelas próprias escolhas e, para ele, parecia impossível recomeçar. Trens não andam sobre as águas, pessoas também não. Mas em "A viagem de Chihiro", trens andam sobre as águas e no evangelho de Jesus, Pedro anda sobre as águas. O amor faz essas coisas, esses impossíveis. O amor faz o sobrenatural. 
Chihiro se dispor a fazer essa viagem significa se dispor a entregar-se ao Haku, o que, literalmente, trás ele de volta a vida. Quando ele acorda, ele corresponde a isso indo atrás dela. A feiticeira não deixa ela sair da casa porque o Haku deve vir buscá-la e recuperar sua honra. Chihiro acreditou no potencial bom dele e defendeu ele para Zeniba, mas Haku errou e, sendo assim, ele também precisava se dispor a ir até lá (agora sabia que podia enfrentar a si mesmo e suas atitudes). 
Enquanto Haku manteve Chihiro firmada na sua essência durante seu período de dor, Chihiro é a  pessoa que se lembra do nome de Haku, ou seja, que devolve a identidade de Haku pra ele. Eu acho o final tão fantástico que não tenho nem palavras para me expressar. 
Haku e Chihiro tem uma ligação muito profunda porque eles já se conheciam antes, apenas não se lembravam. Ele era o espírito de um rio (e eu demorei MUITO pra entender o lance do espírito do rio, muito mesmo!...Japão né?), e quando criança ela acidentalmente caiu nas águas dele... isso faz tanto sentido pra mim hoje! É como quando você esbarra em alguém de repente na vida, alguém que você tem a impressão de conhecer desde sempre, como se você conhecesse de outra vida ou plano espiritual, mesmo que se conheçam a pouco tempo... e de repente tropeça e mergulha naquela pessoa. A Chihiro literalmente mergulhou no Haku! 
Então quando ela diz para ele quem ele é, ele se quebra em pedacinhos, como uma corrente sendo quebrada, e o dragão se torna humano. Ele finalmente se encontra com a essência dele e a abraça!
A cena final, quando Haku e Chihiro se separam é muito, muito linda. Um amor não precisa ser pra sempre, mas se for intenso e se te fizer crescer, valeu a pena!
Por fim, queria comentar que eu gosto muito do físico do Haku também, rs. O cabelinho nos ombros e os olhos verdes. Eu gosto muito de como o dragão mantém o mesmo olhar que o Haku na forma humana. E também gosto muito de como o personagem é composto em vários tons de azul, tanto na forma humana como o dragão, que representa as águas do rio. 

2 comentários:

  1. Man amo muito Viagem de chiriro eu assiti otem e gostei muito.

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    1. Ahhh que massa!! É um dos meus filmes preferidos. Bem vindo ao blog <3

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